segunda-feira, 31 de maio de 2010

História e Filosofia da Linguística – Uma entrevista com José Borges Neto

A seguir, apresentarei um breve resumo da entrevista realizada com o Professor e Dr. JOSÉ BORGES NETO na revista ReVEL, (volume 8, N.º 14).

Clique aqui para visualizar entrevista completa em PDF.


Encontra-se em negrito as perguntas, enquanto as respostas estão resumidamente na sequência.


Podemos dizer que a linguagem é um objeto complexo, independentemente do recorte epistemológico que se faça; parece que é isso que gera diferentes teorias. Como se pode compreender essa pluralidade teórica, sem necessariamente ter de aceitar a noção de “complementaridade” entre as diferentes teorias linguísticas?


- Para facilitar o entendimento, podemos fazer uma distinção entre objeto observacional e objeto teórico: (i) O objeto observacional de uma teoria científica é o conjunto de fenômenos, a porção de realidade, que a teoria assume como seu objeto; (ii) já o objeto teórico é a construção que o cientista idealiza como representação do objeto observacional(o modelo).

- O objeto observacional tomado pelo linguísta é de natureza complexa por conter em si fenômenos dificilmente relacionáveis. Ligado à dificuldade de construir modelos teóricos capazes de abranger o maior número de fenômenos possíveis.

- A grande questão, no entanto, está em unificar esses objetos, porém é muito difícil criar uma teoria que unifique vários objetos teóricos.

- A linguagem engloba fenômenos de diversas ordens, heterogêneos, que pedem explicações também heterogêneas. Tentar entender o tratamento dessa heterogeneidade de “objetos” como um quebra-cabeça, em que as partes se completam e permitem a visualização do todo, não me parece é o melhor caminho.

- Cada linguísta, a partir de seus recortes no objeto observacional, cria uma imagem teórica de seu objeto, que não precisam coincidir, ajustar-se ou ser compatível com nenhum outro modelo, seja do mesmo recorte no observacional, seja em recortes “complementares”.

- Dessa forma, podemos ficar no seguinte estado: por um lado é preciso admitir um “relativismo” temporário; por outro lado é preciso procurar a harmonia consistente entre as várias “linguísticas”.


No plano do fazer epistemológico, há diferenças entre linguística teórica e linguística aplicada? Isto é, há diferença entre o compromisso do pesquisador em relação ao conhecimento quando faz ciência teórica ou quando faz ciência aplicada?


Borges Neto aborda um pouco sobre a Linguística Aplicada buscando mostrar também a Linguística Teórica, por fim conclui que quanto aos compromissos ligados ao fazer científico, não há diferenças entre o pesquisador “teórico” e o pesquisador “aplicado”, mas isso não fica claro na linguística, pois o pesquisador “aplicado” desenvolve, basicamente, tecnologia enquanto o pesquisador “teórico” faz a chamada “ciência básica”.


Qual é a relevância, na pesquisa em Linguística, de conhecer e se orientar pelos filósofos da ciência? Como eles devem dialogar com a Filosofia da Linguística?


“Minha posição é a de que a filosofia deveria ser sempre acompanhada da História da Ciência, que vai nos mostrar como tem sido o comportamento dos cientistas para que escapemos das armadilhas normativas”.

“Vemos muito mais os filósofos atentos ao trabalho dos cientistas do que os cientistas atentos às recomendações e constatações dos filósofos”.

“(...) a necessidade de mais atenção por parte dos filósofos ao que os lingüistas dizem seria fundamental”.


Quais são os problemas de epistemologia mais comuns que têm ocorrido nas pesquisas em linguística, especialmente no Brasil? Nesse aspecto, há diferenças entre a pesquisa no Brasil e em outros países?


Borges diz que o problema mais sério, é a criação de “monstrinhos teóricos”. Relacionando ao fato de o linguísta ler um autor e seguir suas idéias sem saber da consistência das idéias do autor. Mas esse fato esta ligado a uma herança dos gramáticos que dominaram os estudos linguísticos por muitos séculos com base nessa atitude. Outro problema tem a ver com a quase completa ausência de uma história da linguística.

Quanto à situação no exterior, Borges afirma crer que não seja muito diferente do que ocorre no Brasil, porém a história da linguística é imensamente mais forte no exterior do que aqui.


O senhor poderia sugerir alguns livros e textos sobre História e Filosofia da Linguística, especialmente no que tange à Linguística brasileira?


- Seu livro: “Ensaios de Filosofia da Linguística” – (Editora Parábola, 2004);

- É interessante também, ler os textos de Kanavillil Rajagopalan (Rajan) um autor provocativo e instigador de reflexões importantes;

- Leitura dos clássicos da filosofia da ciência, como por exemplo, Popper, Kuhn e Lakatos;

- Na história da linguística, o trabalho de Cristina Altman, a grande responsável no Brasil pelo desenvolvimento da historiografia lingüística;

- também um grupo de pessoas que atua na história da gramática, como: Ricardo Cavaliere (autor de Fonologia e morfologia na gramática científica brasileira. Rio de Janeiro: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2000), e Marli Quadros

Leite (autora de O nascimento da gramática portuguesa: uso e norma. São Paulo: Paulistana/Humanitas, 2007).